Por: Ana Maria L.C. Feijó *
Etimologicamente,
psicologia significa ciência da alma. A curiosidade acerca da alma
sempre foi e continua sendo uma caracterêstica do homem. O primitivo
considerava a alma como uma entidade responsável pelas manifestações
de natureza subjetiva, que se justificava pela vivência dos sonhos,
pelas manifestações delirantes e pela experiência da morte,
chegando a conceituá-la como substância sutil numa concepção
materialista, constituindo um duplo.
Aristóteles,
também interessado no estudo da alma, porém com o propósito de
averiguar sua imortalidade, definiu-a como o ato primeiro, ou seja,
como perfeição fundamental de um ser vivo.
Atualmente,
a alma ainda constitui-se num alvo de interesse do homem
contemporâneo e é descrita como um substrato substancial das
representações, das sensações, das emoções, dos sentimentos;
enfim, de uma expressão psêquica.
Ocorre
que com o advento da ciência, a alma, como objet6 de estudo,
tomou-se inconcebêvel. A psicologia passou a ser definida como a
ciência que estuda o comportamento. O comportamento substitui a
alma, uma vez que a ele é possível empregar todos os princípios
científicos e seus respectivos métodos, principalmente o método
hipotético-dedutivo.
Por
conseguinte, a psicologia passou a pertencer ao rol das ciências
naturais, que contêm no bojo de seu objeto de estudo os fenômenos
fisiológicos. Neste aspecto a psicologia fica reduzida à fisiologia
Brentano
surge em ferrada oposição a Wundt como a qualquer outra proposta
que considere os fenômenos psicológicos como epifenômenos. Por
outro lado defende que não cabe à psicologia preocupar-se com a
condição da imortalidade da alma. Este ponto de vista fica claro na
passagem de seu livro Psychologie du point de vie empirique (1944):
"Assim,
anunciar-se-ia para a psicologia, o mesmo espetáculo que vimos
acontecer com as ciências da natureza. Foi a ambição dos
alquimistas de produzirem ouro, fazendo ligas de metal, que os levou
às pesquisas quêmicas. Mas tendo atingido a maturidade, a ciência
renunciou à transmutação como coisa impossêvel." (p.43)
Desta
forma identifica-se em Brentano uma nova direção ao estudo dos
fatos psicológicos. Define a psicologia como a ciência dos
fenômenos psíquicos, cuja verdade é somente uma verdade relativa,
visto que anterior ao comportamento há a intencionalidade do homem,
cujo ato consciente se revela livre.
A partir
da possibilidade oferecida por Brentano, surgem seus discípulos com
o propósito de aprofundar os conhecimentos sobre intencionalidades
Entre eles pode se destacar Freud e Husserl. Do primeiro
desenvolve-se a Psicanálise, enfatizando a intencionalidade
inconsciente. Do segundo surge a Fenomenologia destacando a
consciência intencional.
Husserl
cria o método fenomenológico, que não pretende ser dedutivo, nem
empírico, consistindo na descrição do fenômeno, tal como ele se
apresenta, sem reduzi-lo a algo que não aparece. Considera como
fundamental a relação. Epistemologicamente, opõe-se à visão de
sujeito e objeto isolados, passando a considera-los como
correlacionados, já que a consciência é sempre intencional.
A escolha
pelo método fenomenológico pode parecer estranha. O método pode
até ser questionado com relação à sua cientificidade. Nas
palavras de Gil (1995), estudioso dos métodos da ciência: "a
adoção do método fenomenológico implica uma mudança radical de
atitude em relação à investigação científica. Por essa razão é
que embora muito comentado, o método fenomenológico não
vem sendo muito empregado na pesquisa social" (p.33).
A
psicologia fenomenológico-existencial propõe a aplicação do
método fenomenológico aos princípios existenciais constantes da
realidade concreta.
A
proposta existencialista inicia-se nas reflexões de Kierkegaard
sobre a existência, que se opunham a toda filosofia racionalista,
principalmente a Hegel, cujo interesse residia no homem abstrato,
cuja vivência caberia num sistema explicativo e absoluto.
Kierkegaard afirma a existência concreta, onde a verdade é
construída na vivência de cada homem, portanto sendo impossível
ser abarcada por um sistema.
Heidegger
vai ser o primeiro a empreender a tarefa de aplicar o método
fenomenológico aos princípios existenciais propostos por
Kiekegaard, entre eles: a verdade, a liberdade, a angústia, o
desespero, a solidão e a decisão.
Na
psicologia foi Rollo May (1954), quem em seu livro Existencia
primeiro sistematizou as idéias dos fenomenólogos tais como
Binswanger, Medard Boss e outros, bem como explicitou a proposta da
psicologia existencial como um enfoque capaz de lançar luz sobre uma
maior compreensão da existência humana. A psicologia
fenomenológico-existencial constitui-se numa tentativa de refletir e
propor soluções às questões da vida cotidiana. Neste aspecto tem
como pretensão não só a reflexão, como também extrair daí uma
praxis.
MAY,
Rollo; Ellenberg. Existencia. Madrid, Gredos, 1954.
BRENTANO,
Franz. Psychologie du point de vie empirique. Paris, Montaigne, 1944.
HUSSERL,
Edmund. A idéia da Fenomenologia. Lisboa, Edições 70, 1958.
GIL,
Antônio C.. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo,
Atlas, 1995.
Autora:
Ana Maria Lopez Calvo de Feijoo
(CRP 05/2834), Doutora em Psicologia pela UFRJ, Mestre em Psicologia
da Personalidade pela FGV/ISOPE, Especialista em Psicologia Clínica
pelo Instituto de Psicologia Fenomenológico-Existencial do Rio de
Janeiro – IFEN, Sócia Fundadora, Presidente, Responsável Técnica,
Professora, Supervisora e Orientadora de monografia do Curso de
Especialização em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia
Fenomenológico-Existencial do Rio de Janeiro – IFEN e Professora
adjunto da Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ. Autora de
livros, capítulos e artigos na abordagem fenomenológico-
existencial. Atua como Psicóloga Clínica na perspectiva
fenomenológico-existencial.
*A publicação foi autorizada pela autora.